segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Porque uso um crucifixo no pescoço




Isto é uma pergunta que sempre me cerca desde que há um bom tempo decidi começar a fazer uso deste adereço. Nada exagerado, uma discreta cruz entalhada de madeira que não deve ter mais que 5Cm e um corpus (a imagem de Cristo pregado à cruz) que um dia já foi dourada, agora já perdeu seu verniz e se tornou ainda mais discreta. É uma peça bem bonita na verdade, mas discreta o suficiente para ser usada em qualquer lugar. 

É incrível como um item tão discreto gera tanta controvérsia! Mas então, porque um cristão evangélico, de linha protestante, como eu prefere usá-lo? 
Certamente que se eu quisesse um adereço de moda, existem outras opções muito mais bonitas para se por envolta do pescoço, então, este não é o ponto. 

Começamos com a história: Crucifixos não são uma tradição da igreja Católica Romana, mas uma tradição da cristandade desde os tempos mais remotos. As igrejas luteranas de modo geral fazem uso das imagens e principalmente dos crucifixos em seus altares, sem que isto represente qualquer abuso litúrgico contrário aos ensinamentos da Palavra de Deus. Infelizmente, a realidade religiosa no Brasil é marcada pela ideia de que os ícones devem ser banidos. Neste ponto, podemos dizer que o uso das imagens entra no que chamamos de “adiáforos”, ou seja, coisas das quais não estamos proibidos, nem somos obrigados. Uma comunidade tem o direito de escolher se fará bom uso destas, ou se prefere que elas não sejam afixadas. Entretanto, de mesmo modo, como um cristão, vivendo a liberdade que Cristo me dá pela sua palavra, confiante de que somente as Escrituras tem a autoridade divina de impor proibições ao exercício da minha fé, também posso ter a minha decisão pessoal de não ser contrário às imagens sacras, desde que faça sempre bom uso destas. 

Usar um crucifixo em meio às comunidades de linha evangélica/protestante hoje é a certeza de ser constantemente questionado de sua crença. Mais que isto, é a certeza de criar a oportunidade para testemunhar da liberdade cristã. 

Vivemos num país onde a cultura religiosa cristã é bem presente, mas marcada por um cristianismo opressor. Cheio de regras para tudo da vida. Como já encontrei várias pessoas decepcionadas com “cristo” porque não puderam viver à altura. Pessoas que não querem ouvir o evangelho porque já o ouviram uma vez e foram rejeitadas!

- “Eu não vou mais em igreja! Quando eu ia, eu só era julgado porque eu....” 
-“Puxa, que coisa triste que aconteceu! Eu vou sempre na igreja, gosto de lá!” 
-“Aonde você vai?” 
-“Eu sou da Igreja Evangélica Lut....” 
-“ PERAI! EVANGÉLICO? E ESSE CRISTO PREGADO NA CRUZ AI?” 
(...) 
- “mas pode?” 

-“ o Teacher, vai ter quermesse lá na minha paróquia, você vai?” 
-“Claro, vou sim!” 
-“Que paróquia você vai?” 
-“ eu sou da Evangélica Lu.....” 
-“não, evangélico você não é! Evangélico não usa crucifixo...” 

Isto, ou alguma variação disto sempre acaba acontecendo! 
Vestir um crucifixo neste contexto que vivemos acaba sendo muito mais que vestir um item decorativo, veste-se com isto a mensagem que levamos. Um pequeno item se torna no testemunho que trazemos. Usá-lo sempre, se tornou, ao menos para mim, ter sempre comigo um “puxador de assunto”, seja nas igrejas que visito, nas reuniões de família, no trabalho, em todos os lugares por onde passo e posso conversar com as pessoas. 

Mas isto é escandalizar os mais fracos, alguns diriam baseados em 1 Coríntios 8:9: “Mas vede que essa liberdade não seja de alguma maneira escândalo para os fracos.” 

Realmente, não podemos usar nossa bíblica liberdade cristã para servir de pedra de tropeço! Mas a questão da liberdade em si não é algo que podemos simplesmente viver sem, aparentando concordar com os demais apenas para não causarmos tropeço! Isto é uma declaração de fé. Nisto, eu tenho o compromisso de explicar às pessoas com toda a longanimidade a razão daquilo que creio. 

Quando abrimos mão da liberdade cristã, na verdade, sacrificamos o evangelho. Transformamos a palavra de Deus, que é vida e salvação em moralismo. Tiramos a obra redentora de Cristo do centro de nossa fé e a substituímos pela nossa própria justiça. 

Sobre a palavra de Deus temos: Foi para a liberdade que Cristo nos libertou. Portanto, permaneçam firmes e não se deixem submeter novamente a um jugo de escravidão. Gálatas 5:1 

E, justamente reconhecendo esta verdade Bíblica, sabemos que não foi a intenção de Cristo, nem de seus apóstolos e profetas dizer o que devemos ou não vestir, mas nos ensinar a fé e o amor. 

Desde os tempos bíblicos questões adiáforas eram vistas e expostas com clareza: 
Essa questão foi levantada porque alguns falsos irmãos infiltraram-se em nosso meio para espionar a liberdade que temos em Cristo Jesus e nos reduzir à escravidão. Não nos submetemos a eles nem por um instante, para que a verdade do evangelho permanecesse com vocês. Gálatas 2:4,5. 

Como os Apóstolos foram zelosos com relação à liberdade que temos em Cristo, e por isto mesmo atraíam os olhares dos demais e testemunhavam desta mesma liberdade! 
Nestes tempos em que tudo parece tão indefinido, cabe a nós, cristãos uma posição clara de nossa fé! Sendo assim, quem não quiser usar um crucifixo, que não o use para a glória de Deus, quanto a mim e quem quiser usar, que o use para a glória de Deus. Para mim, o crucifixo será sempre um testemunho visível de uma certeza invisível. 

Quem diria que um pequeno crucifixo pudesse ser justamente a isca de algo tão maravilhoso!

sábado, 1 de setembro de 2018

Lidando com o luto



Se tem algo realmente difícil para nós, é a realidade da perda. Desde a criação, fomos formados para estarmos pela eternidade, mas no dia em que nossos pais comeram do fruto, a sentença caiu como a pior notícia possível: nossa vida aqui teria um fim. 
É ruim pensar na perda! Mesmo sabendo que ela é inevitável, evitamos pensar sobre ela, até que ela nos pega de surpresa. Um telefone toca, você atende, e pronto! Seu mundo desaba! 

E esta história se repete, não uma, mas algumas vezes ao longo de nossas vidas. E isto dói! 
Bom, não pretendo apresentar aqui algumas palavras de conforto, pois não é segredo para ninguém que pouco pode fazer um artigo breve para diminuir a dor. E nem é a intenção fazer um texto motivacional que deixe uma pessoa alegre por um momento, para voltar a chorar pouco depois. 

Creio que o luto seja importante! Vivemos numa sociedade que quer que todos sejam felizes o tempo todo. Isto não é real. O luto é real. A dor é real. E não tem nada mais natural que expormos nossa fraqueza diante de algo tão trágico. Sofrer também nos faz humanos. 
Mas se este não é um artigo para deixar umas palavras bonitas, seja um momento para entendermos o processo da morte do ponto de vista cristão. 

Por que morremos afinal? 

Então disse o Senhor: "Por causa da perversidade do homem, meu Espírito não contenderá com ele para sempre; e ele só viverá cento e vinte anos". Gênesis 6:3

Esta é a resposta de Deus: é um livramento! Deus, em seu infinito amor limitou nosso tempo aqui na terra porque de outro modo nós viveríamos eternamente, não em alegria, mas com o espírito dividido, nesta mesma luta interior que vivemos hoje entre a vontade do velho homem e a vontade das coisas que são do alto. Não precisamos viver esta angústia para sempre! Deus põe um fim ao nosso conflito. Ele termina a nossa vida aqui, conserva nossas almas em seu amor até o dia em que Ele chamará todos à vida. Naquele dia, quando formos ressuscitados na carne, assim como Cristo é, nós poderemos contemplar, sem traço das antigas coisas, do conflito, da luta em nosso espírito, Sim! Ele nos guia a pastos verdejantes! 

E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal, porque teu é o Reino, o poder e a glória para sempre. Amém’. Mateus 6:13

Quando pedimos que Deus nos livre do mal, este pedido não diz respeito apenas às coisas ruins desta vida, apesar de muitos pensarem assim, todas as petições da oração do Pai-Nosso têm uma ligação direta com as promessas do Dia do Senhor. Justamente por entendermos esta passagem em seu contexto, também entendemos que a sétima petição do pai-nosso não apenas diz respeito às questões presentes, mas que também, na hora de nossa morte, ele nos livre do mal, não por um momento, mas para sempre. Pedimos por uma morte santa. Este é o conforto do cristão! Deus nos livra do mal porque dele é o reino, o poder e a glória! Não pedimos para que Deus não nos deixe morrer, muito pelo contrário, confiamos que quando chegar a hora, teremos Deus por amigo e pai, não como um juiz implacável. Então para quem parte em Cristo, a própria morte é uma coisa boa! 

De todas as passagens sobre o tema, a que de fato coroa este artigo é uma leitura do Antigo Testamento. Umas das tradicionais leituras da liturgia judaica, a Parashat Chaiey Sarah, traduzido como “a vida de Sara” é o texto que pode ser encontrado entre Gênesis 23 e termina em Gênesis 25:18. Esta história começa assim: 

Sara viveu cento e vinte e sete anos e morreu em Quiriate-Arba, que é Hebrom, em Canaã; e Abraão foi lamentar e chorar por ela. Gênesis 23:1,2

Sim, a passagem que fala sobre a vida de Sara começa, justamente, com sua morte. Isto porque a vida dela não é contada por ela mesma. A vida de Sara está presente no cuidado de seu viúvo, Abraão, em lhe dar um fim digno, mostrando o amor que devotava à sua esposa que agora estava com Deus, ao longo do capítulo 23. No capítulo seguinte, Sara está presente através do cuidado de Abraão para que seu filho Isaque não deixe os caminhos em que foi ensinado. Ao conhecer Rebeca, Isaque a leva para a tenda de sua mãe. Sara está presente ali novamente, como se abençoasse o casamento de seu filho. 

No capítulo 25, Sara está presente em sua descendência, os filhos de seus filhos. Ao final, ela é mãe de um povo. 


Esta é a bela passagem sobre a vida de Sara contada através da vida de seus filhos, que andaram nos caminhos que ela tinha ensinado, e que foi passado adiante por gerações, assim Sara viveu muitas gerações! Ao final, Abraão foi sepultado ao seu lado, assim, vemos o amor de seus filhos em colocar seu pai ao lado de sua primeira e mais amada esposa.
A beleza deste texto é esta! Sara tinha partido desta vida, mas vivia em Isaque a cada momento em que ele levava sua vida nos passos que sua mãe deixara. Sara vivia em seus netos e bisnetos, porque eles também viveram no mesmo caminho.

Quanto tempo dura uma vida? 

Certamente a de Sara foi muito longa! Por quanto tempo nossos pais viverão? Por todo o tempo que andarmos em seus passos! 
Em verdade, não precisamos ter medo de perdermos nossos amados familiares, mesmo nossos pais, esposa, marido... Se sentimos um pedaço de nós partir junto com a pessoa amada, também podemos esperar que esta mesma pessoa sempre estará viva em nós enquanto andarmos nos passos que nos deixaram. 

Sara viveu até ver seu filho Isaque ser pai de uma grande nação! Esta separação, talvez seja muito menor que pensamos.
O dia das mães costumava ser muito doloroso para mim, o mesmo do mês de janeiro, quando Cristo fez a chamada. Entender este texto, por outro lado, foi um bálsamo! Finalmente deixei o luto completamente de lado. Ela, afinal, não morreu. Ela está viva! Todas as vezes que faço minhas devoções a noite, lembro-me de como ela jamais perdoaria um dia sem devoção, quando penso em ficar em casa domingo de manhã para dormir, lembro-me de como ela ira me passar um sermão sobre a importância de ir na EBD, Se penso em não dizer algo que eu deveria, lembro me dela balançando o chinelo em minha direção... ah como ela vive!