quinta-feira, 19 de abril de 2018

Gêneros Literários na Bíblia - parábolas


Parábolas




Frequentemente eu vejo pessoas fazendo uma confusão sobre o que é uma parábola na Bíblia. Não raro, vejo pessoas dizendo:
  • se cita nomes, então é uma história real;
  • todos os elementos tem um significado;
  • só é parábola se Jesus disse que é parábola;
  • etc...
Parábolas em geral são usadas para ilustrar ou facilitar a compreensão de um assunto complicado; falar do desconhecido a partir do conhecido e servir como uma ponte para chegar lá. Quando Jesus fala do semeador que vai semear (Mt 13.3), ele não está falando de alguém realizando literalmente esse trabalho, mas de sua própria missão de semear o Evangelho. O objetivo da história é descrever alguma coisa diferente do que ela na verdade está afirmando. E é justamente pelo fato de uma parábola não ser nem sempre uma simples metáfora, que ela às vezes adquire um grau de complexidade maior em sua interpretação. É preciso atenção nas ações, personagens, situações e outros detalhes significativos. 

A opção de Jesus em ensinar por parábolas parece ser de fácil explicação. Diz-se que as parábolas têm a vantagem de desarmar àqueles que possam ofender-se com sua mensagem, visto que o ouvinte freqüentemente tem que esperar até o último momento da história para descobrir seu significado, ou mesmo, e aí pode estar o ponto principal, se enxergar dentro da história. Um exemplo disto pode ser a parábola de Natã ao rei Davi (2 Sm 12.1-10).

Quando o profeta Natã repreendeu a Davi, ele se usou de uma parábola a fim de ilustrar o que de fato o rei havia feito ao tirar a esposa de Urias, Bate-Seba. Num determinado momento, Davi “se enxergou” na história e assim ele só não compreendeu o que estava sendo dito, como se deu conta o que tinha feito e aí se arrependeu e pediu perdão a Deus. Nesse caso a parábola atingiu completamente seus propósitos.
A parábola é uma forma de cativar os ouvintes, fazê-los parar e pensar acerca do seu modo de agir, pensar e crer, a fim de levá-los a reagir e dar alguma resposta ao Senhor Jesus.


A Interpretação das Parábolas


As parábolas tornaram-se um veículo de revelação das verdades a respeito do reino de Deus presente em Jesus, ainda que algumas vezes elas lhe dão um tom enigmático. “Ao que respondeu: Porque a vós outros é dado conhecer os mistérios do reino dos céus, mas àqueles não lhes é isso concedido. Pois ao que tem se lhe dará, e terá em abundância; mas, ao que não tem, até o que tem lhe será tirado. Por isso, lhes falo por parábolas; porque, vendo, não vêem; e, ouvindo, não ouvem, nem entendem” (Mt 13.11-13).

Portanto, em certo sentido não há como evitar debates e não estamos completamente livres de equívocos na hora da interpretação. Na verdade, até mesmo os discípulos algumas vezes ficaram intrigados pelas histórias ouvidas de seu mestre (Mc 4.13).

É este detalhe particular que pode nos levar a refletir que existe algum grau de dificuldade por causa da identificação ou não com os personagens ou fatos da história narrada. Por isso, a tarefa da interpretação exige cautela e atenção. Seria bem mais prático se Jesus tivesse explicado todas as parábolas, como fez com algumas (Mt 13.24-30 – 36-43). Além disso, é preciso observar que nem sempre os personagens, fatos e objetos de uma parábola têm um significado simbólico ou alegórico.

Portanto, o primeiro aspecto a ser levado em conta é o contexto original em que a parábola foi contada. Para elevar o grau de exatidão na compreensão deste tipo de gênero literário, além de obviamente entender bem a parábola em si, é fundamental prestar bem atenção no motivo pelo qual Jesus a contou. A observação do contexto particular e original em que as parábolas foram contadas é um elemento que pode se tornar decisivo para compreender bem o ensino de Jesus. É bem provável que algumas vezes nem havia necessidade de esforço para interpretá-las, visto que os ouvintes originais tinham e conheciam bem os pontos de referência usados e mencionados por Jesus. 

Quanto ao seu entendimento, um cuidado necessário é sobre a tendência natural da alegorização, ou seja, como se cada item (personagem, fato ou ação) da parábola tivesse um significado correspondente e/ou diferente do que está escrito. É verdade que parábolas podem ter essa característica, como o próprio Jesus explicou na parábola do semeador. Porém, isso pode não funcionar tão bem em outras parábolas. A que vamos comparar, por exemplo, na parábola das virgens prudentes e néscias (Mt 25.1-13), o azeite? O pedido de empréstimo do azeite? Às vezes é preciso tirar os olhos dos detalhes, que nem sempre compreendemos e fixar nosso olhar no grande ensino pretendido por Jesus. No caso da parábola das dez virgens, a vigilância.

Nesse caso poderia se afirmar que alguns elementos da parábola estão lá, mas não precisam ser decodificados na hora da interpretação, simplesmente porque não são condutores de algum tipo de lição.


No caso do Rico e Lazaro, o objetivo é claro em mostrar que os mais favorecidos neste mundo não necessariamente também serão favorecidos após a morte. Lázaro, que mendigava migalhas encontrou o repouso junto a Deus, mas o rico, este foi ao tormento eterno. Com esta parábola aprendemos que o reino não se conquista com riqueza, poder, posição social. Nada que há em nós mesmos é suficiente para assegurar nossa salvação. Quando o rico, já no sofrimento eterno tenta negociar os termos de sua própria desgraça, a ele é apontado o peso da Lei. Já não havia favores, apenas a condenação da lei, pois debaixo da lei ele morreu. Já lázaro, não tinha nada de si mesmo a oferecer, ele, que sempre dependeu da graça, a encontrou no seio de Abraão para sempre. 

Esta é uma parábola que mostra ao mesmo tempo o reino de Deus e a condição humana.
A ideia de que apenas o fato de se usar um nome a torna uma história real, como vemos constantemente ser dito, é uma visão não apenas errada, mas que leva a erros maiores. Como vemos neste breve texto que fiz para o blog, parábolas não são para serem alegorizadas em tudo, e também não são histórias mentirosas, são histórias que mostram uma realidade que deve ser refletida.

Temos bons exemplos de parábolas cristãs fora da Bíblia também. Um bom Exemplo, as Crônicas de Nárnia, de Lewis. É uma parábola do Evangelho, inclusive, escrita nesta intenção. Se você leu, ou assistiu às Crônicas de Nárnia e não entendeu que Aslan é na verdade uma figura de Jesus, voce simplesmente não entendeu nada da História. E nisto, há elementos significativos, como o próprio Aslan, sua morte e ressurreição, as crianças, mas há também elementos que apenas compõem a história, personagens apenas de fundo.

Não vamos cair numa visão muito simplista e dizer que só é parábola quando não cita nomes e se está dizendo no texto que é uma parábola (embora BOA PARTE está sinalizado). Parábolas são um gênero literário riquíssimo. Sejamos cuidadosos ao interpretar, e, se possível, com a ajuda de bons comentários bíblicos!

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