terça-feira, 29 de maio de 2018

Quem é o Anticristo?



As Escrituras se referem ao anticristo de duas formas:
Por um lado, é um termo para designar todos os que solapam a palavra de Deus com doutrinas de homens (1Jo 2.18). Todos os falsos mestres devem ser considerados anticristos (adversários de Cristo), uma vez que nosso Senhor insiste em que na igreja se não ensine nenhuma outra doutrina além da doutrina das Sagradas Escrituras (Mt 28.20; Jo 8.31-32; 17.20; 5.39; Rm 16.17; 1Pe 4.11; 1Tm 6.3ss; 2Tm 3.15-17; 2Jo 10; Ap 22.18-19). Todos quantos desconsideram esta ordem divina são rebeldes e adversários de Deus (Lc 11.23). 

Por outro lado, também designa o grande Anticristo, cuja vinda se prediz em 2Ts 2.3-12. Em 1Jo 2.18 encontramos uma cuidadosa distinção entre este Anticristo e os “muitos anticristos”, e sua aparição é um sinal dos últimos tempos. 

Como as Sagradas Escrituras retratam o Anticristo como o iníquo, de quem todos os crentes se devem acautelar e a quem podem, logicamente, conhecer (2Ts 2.8), cabe a nós avaliarmos as características deste com base na revelação divina em Sua Palavra. 



Segundo 2Ts 2.3-12, estas características são inconfundíveis: 

1) A apostasia: conforme 2Ts 2.10-12, a apostasia é causada pela “operação do erro”, ou seja, os homens muitos são levados pelo erro e condenados por sua incredulidade. É, portanto, apostasia de Cristo e de sua palavra (2Ts 2.4). 

2) O “assentar-se no santuário de Deus” (2Ts 2.4). A grande apostasia de Cristo e do Evangelho não sucede fora da igreja, mas dentro dela; pois o “santuário de Deus” é a igreja (1Co 3.16ss; 1Tm 3.15; 2Tm 2.20). A grande apostasia que o Anticristo leva não é, portanto, como muitos tem interpretado e até pregado em muitos púlpitos. na difusão de cultos anticristãos, mas em apostasia dentro da igreja, isto é, uma violação do Evangelho que se dissimula com palavras e formas piedosas. Esta prática não é apenas temporária, mas é permanente; pois o Anticristo continuará assentado no santuário de Deus até a segunda vinda do Senhor (v. 8). 

3) O opor-se e levantar-se contra tudo que se chama Deus. O Anticristo, que está assentado no santuário de Deus, faz constante oposição a Deus e à sua palavra, sendo chamado como autoridade suprema em religião (“ostentando-se como se fosse o próprio Deus”, v. 4). Sob o reinado do Anticristo, a igreja não obedecerá nem a Cristo nem ao seu Evangelho, mas faz o que o Anticristo com sua pretensa autoridade divina exige, Todos os que se submetem a ele devem, portanto, obediência antes aos seus ensinos que à Palavra de Deus. 

4) A eficácia de Satanás no Anticristo. Embora o Anticristo não seja o próprio Satanás, o seu “aparecimento é segundo a eficácia de Satanás, v. 9; isto é, ele se apresenta pela operação astuta de Satanás e se mantém no centro da igreja pelo poder de Satanás; Embora todas suas obras pareçam genuinamente piedosas com a Igreja de Cristo, com a ajuda de Satanás está em condições de exercer “todo o poder e operar sinais e prodígios da mentira” (v. 9). O Anticristo ensina doutrinas de mentira, também realiza obras de mentira. Sua norma assenta, pois, em sua habilidade, para enganar os homens por todas as modalidades de mentira. Veja que operar seus prodígios é o que toma a cabeça de muitos e imaginam que ele será como um “santo milagreiro" fazendo sinais o tempo todo, mas biblicamente somos advertidos de algo muito mais sombrio. Ele se assenta no lugar mais nobre entre os filhos de Deus e sua doutrina é aparentemente cristã, mas seus enganos o denunciam. Satanás é pai da mentira, e reconhecemos este seu filho pela mesma característica. 

5) Ele é revelado e desfeito pelo sopro da boca do Senhor, (v. 8). Ainda não estamos falando de sua derrota final, o sopro da boca do Senhor o revela. O Anticristo permanece ignorado por muitos (“mistério da iniquidade”, v. 7); mas, a seu tempo, é revelado pela pregação da palavra de Deus. Ou seja, Temos o anúncio que o próprio Deus levantou seus ministros para pregar a sua Palavra, pura como o sopro da boca do próprio Deus, e toda a mentira foi exposta. Isto, porém, não significa o fim de seu reinado; porque somente o Senhor mesmo o destruirá pela manifestação de sua vinda” (v. 8); vale dizer, o reinado do Anticristo continuará até o dia do juízo, sua doutrina ainda será ouvida e ele continuará no seio da igreja. 

6) A vinda e o reinado do Anticristo são a manifestação da ira de Deus para com todos os que “não acolheram o amor da verdade para serem salvos” (v. 10). Sua aparição traz, portanto, a condenação de muitos (v. 12) e, desta maneira, prefigura a ira condenatória de Deus no dia do juízo (v. 3). Os que o seguem não compreendem como é abominável rejeitar a palavra de Deus como única fonte e padrão da fé e anatematizar a doutrina da justificação pela fé em Cristo somente. 


Muitos tem crido conforme vemos em alguns filmes, em um homem que seja um político influente, mas a verdade Bíblica é outra, o trono do Anticristo está no templo de Deus, Com todas estas características percebemos então que não falamos em enganadores individuais (Ario, Maomé, um propagador de heresias qualquer que se de nome) nem em governos individuais (Nero, Napoleão, etc..). 

Não tem cabimento queremos dar um nome individual, considerando que São Paulo aqui descreve o “mistério da iniquidade” que já operava em seu tempo e que permanecerá até o fim dos séculos (vv. 7-8), Portanto, não pode se tratar de um único homem, mas de uma sucessão inquebrada que remonta aos tempos do Santo Apóstolo, reina em nossos dias e que já foi exposta por suas próprias doutrinas, mas que continua a se assentar no seio da igreja geração após geração. 

Embora a doutrina Bíblica sobre o Anticristo não seja artigo fundamental de fé, visto que ninguém se salva por isso, mas somos salvos somente através de Cristo por Graça e fé, ainda assim não a devemos considerar de pouca importância, uma vez que Deus nos transmitiu esta verdade (2Tm 3.16).

quinta-feira, 24 de maio de 2018

O Louvor e a Devoção na vida diária




Uma verdade que é bem sólida para nós é que a salvação é uma via de mão-única. É um presente de Deus para o homem. Não há nada que nós possamos fazer para merecer este dom. Disto, uma consequência imediata desta teologia é o questionamento do posicionamento especial do clero. Ter os sacerdotes como intermediários entre o divino e o povo, advogando em favor do povo, que padece e se compadece dos sacrifícios oferecidos. Mas, se a salvação não depende em nada destas obras de intermediação e penitência por parte dos sacerdotes, eles não são indispensáveis para o estudo da Palavra entre as famílias cristãs. Todo cristão se torna um pequeno sacerdote em seu próprio lar. Este é o sacerdócio de todos os crentes, o sacerdócio universal.

Todos os que receberam a salvação por Graça e fé experimentam este contato com o Deus presente na Palavra de modo direto. Esta, inclusive, foi a razão pela qual a Bíblia foi traduzida para a língua alemã (a língua do povo).

Nosso conceito de vocação, neste sentido é bem diferente. Nenhuma vocação arrecada mais méritos diante de Deus. Uma vida de regime de trabalhos específicos não te levará mais próximo de Deus.

A palavra “vocação”, que vem de “chamar” no latim, fez, durante muito tempo as pessoas entenderem que sacerdotes tinham uma posição especial, um estado de graça maior que os demais, pois estes era literalmente “chamados” ao ministério.

Para Lutero, cada profissão era uma vocação. Deus vocaciona de seus ministros, mas também de donas de casa, padeiros, sapateiros, banqueiros, e todos os demais para servirem no corpo de Cristo. Deus vocaciona pais, colegas e amigos para caminharem juntos. Todas estas são vocações. (e isto mais tarde, especialmente sob o modelo calvinista irá inaugurar o que Max Weber chamaria da “ética protestante”, que foi a base para a migração do antigo feudalismo para a sociedade capitalista.

Em suma, isto significa que a vida diária não é formada de atividades religiosas e outras não-religiosas. Nenhuma delas é comum, mas todas são vocação divina.

Portanto, o que leva um jovem a decidir largar sua família e um bom emprego e partir para um seminário de forma alguma o torna mais próximo de Deus senão apenas o tempo que passará em contato devocional com a Palavra. Esta decisão, nada mais será que a absoluta convicção de que nenhum outro caminho o realizaria nesta vida.

Na Alemanha, Philip Spener (1635-1705) e alguns que o acompanharam encorajavam então os fiéis a não apenas participarem nos cultos, mas também em pequenos grupos (Collegia Pietatis) para estudo bíblicos regulares e entoarem hinos. 

Quando entendemos então que buscar a Deus em família ou mesmo a sós é privilégio de todos os filhos e filhas de Deus, mesmo quando não há um ministro ordenado para tal, então surge esta bela forma de devoção que são os altares domésticos.

Um lugar visível na casa destinado a oração e leitura da Palavra que nos ajuda a mantermos a frequência e nos inspira.

Por certo que a igreja é o lugar próprio da oração litúrgica e um local privilegiado para a dignidade do sacramento do altar, a presença real de Cristo. Para a oração pessoal, esta antiga tradição dos recantos de oração, um pequeno altar doméstico pode servir para se estar no segredo diante do Pai. Em família, o altar doméstico favorece a oração em comum.

Na vocação de nossas casas, nossas famílias são uma verdadeira igreja, a ecclesia domestica. Nossos pais são nossos primeiros arautos da fé ao serviço da vocação própria de cada um.

Como bem diz o catecismo romano: §1666. O lar cristão é o lugar onde os filhos recebem o primeiro anúncio da fé. É por isso que a casa de família se chama, com razão, «Igreja doméstica», comunidade de graça e de oração, escola de virtudes humanas e de caridade cristã.


Com isto, entendemos certamente que a ideia de um pastor, presbítero, diácono, ou outro nome que se dê possuir uma proximidade maior com Deus, ou um mérito por suas ações não é o melhor pensamento cristão. Deus ama seus vocacionados, tanto os bispos quanto os sapateiros!

Ao deixarmos nossa vida devocional apenas nas mãos de um pastor não é a melhor medida de uma vida cristã. Lembro-me com tristeza de um pastor amigo me confidenciando de uma mãe que tinha lhe perguntado quando ela deveria começar a falar de Jesus para seu filho. O menino já tinha cerca de seus cinco anos.

Certamente que a salvação daquela pequena criança não depende da ecclesia domestica, mas sem dúvidas, esta família deixava de gozar do privilégio de serem para o filho seus primeiros ministros e catequistas. De fato, ao professarmos a salvação somente pela fé e pela graça, entendemos que a prática de se ter um altar doméstico não fará de qualquer pessoa mais ou menos santa. Mas sem dúvidas, ter um centro de devoção todos os dias ao alcance dos olhos não nos deixa esquecermos que somos todos chamados por Deus e temos o prazer de poder estar com o Pai pelos méritos de Cristo, na unidade do Espírito.



COMO MONTAR UM ALTAR DOMÉSTICO?

A boa notícia é que não há uma lista de itens que você precisa anotar e comprar, nem um local onde deva ser obrigatoriamente posicionado. Não importa se está na sala, ou num quarto, nem se é repleto de itens e coisas bonitas.

Há quem mantenha um altar liturgicamente completo, velas, bíblia, crucifixo, flores, paramentos, incenso, ícones, dependendo da tradição religiosa que se segue. Há quem tenha apenas uma bíblia e um hinário, há quem tenha uma mensa montada constantemente, há quem possua um pequeno oratório, e aqueles que no momento da devoção tiram os itens guardados e se reúnem. Realmente, a estética não é o foco, mas seu uso.

Não importa qual a vocação de sua vida profissional, lembre-se que também há uma vocação na sua vida espiritual e desenvolvê-la em família em torno de um pequeno altar é uma bela forma de manter viva a igreja doméstica.

terça-feira, 22 de maio de 2018

Sistema de Governo

Rev. Dr. Rudi Zimmer, Presidente da IELB em sua nomeação

Como muitos cristãos, Luteranos usam a figura usada por São Paulo em 1 Coríntios 12. 12-31 da igreja como sendo o corpo de Cristo. Um corpo tem muitos membros, mas permanece um corpo somente. Cada membro deve desempenhar sua função para que o todo seja saudável. Esta imagem funciona muito bem entre nós em face da doutrina do sacerdócio universal dos crentes. 

Luteranos se definiram por vias doutrinais. O próprio luteranismo se origina de debates com o catolicismo sobre a justificação pela fé. Algumas outras denominações cristãs se definiram por questões políticas. Congregacionalistas, por exemplo, concedem a cada congregação independente uma grande autonomia. Presbiterais, em contraste, se organizaram num modelo piramidal por eleição (representantes das congregações representam a igreja no sínodo, representantes dos sínodos tomam parte na assembleia geral, ou concílio). 

Justamente pelo fato de luteranos terem se definido mais doutrinariamente que por política, existe certa diversidade na organização de seus membros. Lutero era conservador e não fazia acordos em questões doutrinais, mas era cauteloso e muito flexível em questões de estética, rituais e organização. Esta flexibilidade se mostra até hoje. Existem sistemas congregacionais e presbiterais, algumas independentes que se governam pela assembleia de seus membros, outras se associam em sínodos. 

Em países europeus as comunidades são lideradas por bispos, assim como no modelo católico. Na Alemanha, o luteranismo e o catolicismo são religiões oficiais do Estado, na Escandinávia, é a única protegida por leis específicas. (deve-se lembrar que, ainda assim, a liberdade religiosa nestes países é a mais robusta no mundo). 

Não foi o objetivo da reforma alemã alterar fundamentos da relação entre igreja e Estado, como o tentaram outros reformadores, como Zwinglio e Calvino. Assim, fora dos países que a adotaram como religião oficial, você deve voluntariamente optar por pertencer à esta confessionalidade (ao invés de já ser incluído nela ao nascer). Mesmo nestes países, é comum que seus líderes eleitos sejam bispos. 

No Brasil, a Igreja Evangélica Luterana do Brasil não tem o costume de nomear bispos, mas são chamados conselheiros distritais, e para a liderança geral de toda a igreja no país, o pastor presidente faz as vezes do arcebispo nas estruturas da comunidade europeia, atualmente, posição ocupada pelo Rev. Dr. Rudi Zimmer, grande teólogo a quem sou grato a Deus por ter confiado nossa liderança para os próximos anos.

Modelo Europeu com o episcopado histórico (ordem de bispos)


domingo, 20 de maio de 2018

Como Lutero ainda desafia os protestantes




Martinho Lutero desafiou e continua a desafiar a teologia romana de modo profundo, mas ele também desafiou e continua a desafiar diversas vertentes protestantes que se levantaram. Na verdade, na visão de alguns, Lutero parece desafiar o protestantismo muito mais que o catolicismo romano. 

A maioria dos escritos não luteranos sobre a vida e obra de Lutero, até onde os tenho lido, parecem não compreender exatamente os pontos centrais. 

Protestantes em geral amam falar em “aceitar Jesus pela fé”, o que certamente parece remeter a um dos grandes ensinos luteranos, Sola Fide. Normalmente, entretanto, isto é apresentado como uma decisão que precisamos tomar, como se por nosso próprio livre-arbítrio. Lutero, em contrapartida, repudiava qualquer ideia de livre-arbítrio em matéria de salvação, já que nossa confiança em nosso próprio livre-arbítrio está no centro de toda tentativa de se buscar justificação por boas obras ao invés de ser somente pela fé. A grande meta pastoral do pensamento cristão de Lutero sobre a justificação pela fé é de nos libertar do jugo da ideia de que nossa salvação dependa em qualquer parte de nós, nosso coração, nossa vontade, nossas obras, o mesmo de nossa decisão em “aceitar Jesus”. 

Para tudo que nos dispomos a fazer neste sentido, poderíamos nos perguntar “Eu estou fazendo o suficiente?”, E a resposta de Lutero será sempre: “Não o suficiente para te livrar da condenação”. Nenhum ato de nosso livre-arbítrio, e consequentemente nenhuma decisão nossa, será uma exceção a esta resposta. 

Deus já prometeu estas coisas para nós em sua Palavra, e pessoalmente nos dá a cada um que somos batizados, nos dizendo a cada um em particular “EU TE batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. Aqui, “EU”, literalmente significa Cristo, que fala através da boca do ministrante, e “TE”, literalmente significa a mim em particular; a cada um a quem é dirigida em particular estas palavras em cada tempo e lugar. 

Logo, pensar que eu devo fazer uma decisão pessoal se eu pertenço ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, é duvidar da palavra de Deus dada a mim no batismo, e, com efeito, ter Deus por mentiroso. 

Falta de fé permanece como um problema na vida cristã, e é importante para nós sentirmos nossa carência à medida que somos assaltados por tentações, as quais Lutero costumava chamar “anfechtungen”, e as considerava uma parte essencial da caminhada com Cristo. Seríamos loucos em confiar durante as tentações em nosso próprio livre-arbítrio, ou nossa habilidade de crer. 

Para Lutero, devemos crer que somos cristãos porque Cristo assim o disse em nosso batismo, não porque tenhamos feito uma decisão, ou tivéssemos uma experiência de conversão, ou feito algo para nos tornarmos cristãos. Se me perguntassem se sou um verdadeiro cristão, a resposta invariavelmente seria “Sim, eu sou batizado!” 

Quando Lutero ensina a justificação somente pela fé, ele não está nos dizendo para termos fé na nossa fé, ao contrário, ele fala de colocarmos a nossa fé sobre a Palavra de Deus somente( Sola Scriptura). Qualquer relato de fé que se baseie em experiência humana, ou qualquer tentativa de tornar a fé algo subjetivo (relativo ao próprio indivíduo), como a moderna teologia liberal tem feito, certamente perdeu o ponto que Lutero se referia.
O que experimentamos, na maior parte é o nosso próprio pecado e a falta de fé 

Fé verdadeira significa justamente nos afastarmos da experiência pessoal e nos aproximarmos de Cristo pela Palavra, contra toda dúvida e tentação, de que toda a Palavra de Deus dada a nós por seu Filho (Solus Christus) é certamente verdade. 

Justificação somente pela fé(Sola Fide), e consequentemente, Somente por Cristo (Solus Christus)!
Isto tem total relação com o ouvirmos Cristo chamando a cada um de nós dizendo “te batizo”, de forma que isto me inclui. 

Quando ouvimos “Este é meu Corpo, dado por vós”, falado em linguagem litúrgica própria, é mera incredulidade negar que Cristo seja verdadeiramente meu. De mesmo modo, também é somente crendo que estas palavras são direcionadas a mim é que sei que verdadeiramente sou Cristão, que tenho um salvador, que eu sou co-herdeiro em sua vida eternamente, não por que eu sei que eu tenho fé ( e francamente, isto não é algo que eu possa comprovar por mim), mas porque eu sei que Cristo não mente. 

Nosso cristianismo não seja de termos fé em nossa fé, mas pela Palavra daquele que não pode mentir, sabemos que estamos seguros com ele, e que ele nos guardará, porque assim ele prometeu.

quinta-feira, 17 de maio de 2018

O Pentecoste nosso de cada dia





O Pentecostes tinha que ser observado no antigo Israel no 50º dia depois que o sacerdote levasse o molho da oferta movida dos primeiros grãos que tinha sido colhido na primavera (Levítico 23.15-21). Recordar a aliança do Monte Sinai, era lembrar o nascimento da nação de Israel quando foi constituído através da lei de Deus dada a Moisés. Era a festa da aliança entre Deus e o povo escolhido (Êxodo 19.3). Isto é de grande significado, porque nos ajuda a compreender a razão pelo qual o Espírito Santo descendeu no dia de Pentecoste. A Igreja nascia assim no mesmo dia em que a nação de Israel. Foi dada à luz ao Israel espiritual, o novo povo de Deus, a Santa Igreja de Cristo.

 As imagens do nascimento da Igreja nos lembram os eventos acontecidos na criação quando Deus sopra vida a Adão, enquanto Jesus sopra o Espírito Santo aos seus apóstolos. No Monte Sinai, encontramos as imagens de uma teofania com fogo, enquanto o dia de Pentecostes observamos sinais semelhantes. Deus nos lembrava assim que, a partir deste momento, a lei não estaria escrita em tabuas de pedra, mas nos corações do Seu povo a través do Espírito Santo (2 Coríntios 3). Isto ainda é mais compreensível quando o apóstolo Pedro proclama que a profecia de Joel estava se cumprindo naquele momento (Atos 2.16). 

Uma nova criação surge em meio de Jerusalém, a Igreja nasce. Jesus diz, “Mas eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim” (João 12.32). Deus estava realizando o plano e cumprindo a promessa ao povo de Israel através de Jesus Cristo para resgatar as nações do pecado e da morte. A vinda do Espírito Santo no dia de Pentecostes se revelou o plano redentor do Pai para resgatar as nações e criando, assim, um novo povo, um novo Israel, um Israel espiritual (Gálatas 6.16), a Igreja de Cristo, Una, Santa, Católica e Apostólica. O batismo do Espírito Santo no dia de Pentecostes foi o sinal desse novo dia, o nascimento da Igreja.

Esta foi a graça concedida naquele dia. O pentecoste foi o nascimento da igreja, um evento único, que daquela forma não o veremos mais. Isto significa que não veremos mais Deus como um fogo consumidor sobre nós? De forma alguma! A cada um de nós há um pentecoste verdadeiro, no dia que, pelas águas, fomos batizados para dentro do corpo de Cristo.

O Espírito Santo, que é Deus juntamente com o Pai e o Filho, nos alcança pelo batismo; nos torna de tal forma repletos de sua graça que nos liberta do pecado e da morte. E de terrenos que somos, quer dizer, feitos do pó da terra, nos faz espirituais, participantes da glória divina, filhos e herdeiros de Deus Pai.

Pelo batismo, somos inseridos no Corpo de Cristo, fazemo-nos coerdeiros e irmãos, destinados a ser um dia glorificados e a reinar com ele. Em vez da terra, dá-nos de novo o céu, abre-nos generosamente as portas do paraíso, honra-nos mais do que os próprios anjos. 
O batismo, que nada mais é que água unida à palavra de Deus, e, portanto, Evangelho em toda a sua extensão, se constitui de simples água, mas, com a Palavra de Deus, as águas divinas que para nós apaga as imensas e inextinguíveis chamas do inferno.

Israel foi criada duas vezes, uma para os Judeus, e a segunda, o pentecoste de todos nós, cristãos. De modo semelhante, os homens são concebidos duas vezes: uma corporalmente, a outra, pelo divino Espírito. Acerca de um e de outro nascimento, escreveram muito bem os autores sagrados.

São João diz: A todos que o receberam, deu-lhes a capacidade de se tornarem filhos de Deus, isto é, aos que acreditam em seu nome, pois estes não nasceram do sangue nem da vontade da carne nem da vontade do homem, mas de Deus mesmo (Jo 1,12-13).
Todos os que acreditaram em Cristo, afirma ele, receberam a capacidade de se tornarem filhos de Deus, quer dizer, pelo Espírito Santo, e participantes de toda sorte de bênçãos das regiões celestiais. E para ficar bem claro que assim como em pentecoste, o mesmo Espírito nos faz filhos em nosso batismo, acrescenta estas palavras de Cristo: Em verdade, em verdade, te digo, se alguém não nasce da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus (Jo 3,5).

A fonte batismal é simultaneamente água e fogo. São João Batista, de acordo com esta expressão: da água e do Espírito, diz a respeito de Cristo: Ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo (Mt 3,11; Lc 3,16). 
Como um vaso de barro, o homem precisa ser limpo pela água e fortalecido pelo fogo. (Deus, com efeito, é um fogo devorador). Precisamos, portanto, do Espírito Santo para nossa perfeição e salvação. Pois o fogo espiritual sabe também regar, e a água batismal é também capaz de queimar.

A Igreja nasceu pela água e pelo fogo, e cada um de nós também lembramos nosso nascimento a cada pentecoste, pela água e pelo fogo que nos deu o poder de sermos chamados Filhos de Deus!

terça-feira, 15 de maio de 2018

O Terço e a Devoção



Existe uma palavra que luteranos entendem muito bem “adiáforo”. Este termo derivado do grego e que literalmente quer dizer “indiferente”, para nós tem um uso bem específico. 

Quando falamos em liberdade cristã, temos uma posição extremamente escriturística. Um dos motes da Reforma protestante foi o “Sola Scriptura”, com isto entendemos que somente as Escrituras, dotadas da inspiração divina, é que podem nos agravar as consciências, nos dizer o que devemos e o que não devemos crer e viver. Entretanto, sobre muitos pontos, ela não prescreve algo taxativamente. Nestes quesitos, alguns irmãos de outras linhas teológicas criam seus próprios usos e costumes, como permitir ou não o uso de televisão, aceitar ou não o uso de maquiagem, calças, ou mesmo o que pode ou não ser usado como elemento de culto. 

Para nós, preferimos nos firmar naquilo que está escrito, e nos silenciamos onde o texto também silencia. Desta forma, sobre muitos aspectos temos “adiáforos”, coisas que não são essenciais para nossa salvação, mas também não representam nenhum perigo à nossa espiritualidade. 

Uma destas coisas compreendidas pela liberdade cristã está no uso do rosário. Talvez a prática que mais gere espanto da parte de alguns. Vocês rezam o terço igual os católicos? Esta é uma pergunta recorrente. De fato, é uma realidade pouco conhecida de muitos. Tenho de fato um grupo de amigos luteranos que fazem das orações do terço uma prática diária, assim como eu tenho feito, de igual modo, conheço pastores que não gostam desta prática. E como lidamos com isso? 

Com a maior naturalidade. Em ponto algum das Escrituras vemos uma ordem de que Cristãos devam fazer o uso de um terço, ou mesmo uma recomendação a não o usar. Entender que existe liberdade cristã, é entender que a mesma liberdade que tenho de escolher usá-lo em minhas devoções individuais, o outro tem de não o usar. Somente as escrituras tem a palavra final sobre todos nós. 

Lembro-me que quando criança, as devoções em família eram ponto de honra, todos deviam estar ali no horário combinado. Sabíamos que sem devoção não tem cama! Não importava o quanto estivéssemos cansados, ou mesmo que fosse tarde da noite, todas as noites estávamos lá, reunidos em família, havia algo cantado, leituras, como eu era criança, sempre o que foi lido era explicado e comentado, e então vinham as orações. 

Muitas vezes, tomado de sono, cansado, outras vezes de mau humor, não me sentia pronto para orar, palavras simplesmente não me vinham à boca. E então, as orações muitas vezes eram repetidas. 

Muitos podem dizer que isto não estava sendo de nenhum proveito, mas devo discordar, foram estas orações que não me deixaram esfriar na minha vida de oração, foram elas que me mantiveram quando não sabia o que dizer ou não tinha ânimo. 

Hoje sinto falta de ter minha mãe me chamando para a devoção, e esta proximidade da data do dia das mães faz esta falta doer mais fundo. São dias assim que me sinto completamente deprimido. Não tenho mais as explicações que me acompanharam, hoje, muitas vezes sou eu quem agora explica as passagens lidas. 

O que dizer diante do altar quando a lembrança apenas traz lágrimas aos olhos e não temos, ou não sabemos como ou o que dizer? Neste momento, me lembro das noites em que estava de mal humor, mas eu tinha uma oração para fazer, porque mesmo que minha mente e meu coração não estivessem no lugar, aquelas orações me guiaram como uma luz num lugar escuro. Então eu as repetia. 

Hoje, eu posso estar de pé em frente ao altar sozinho, não ter para quem explicar, ou quem me explique, posso não ter palavras para dizer o que estou sentindo, mas posso pegar aquele terço e a cada conta dizer Ἅγιος ὁ Θεός, Ἅγιος ἰσχυρός, Ἅγιος ἀθάνατος, ἐλέησον ἡμᾶς.”, Santo Deus, Santo forte, Santo Imortal, tem piedade de nós. E a cada vez que clamo, ter de Deus o renovo da esperança em seu Evangelho. 

O Terço é algo obrigatório? Não. Faz a pessoa mais santa? Não. É um amuleto contra o mal? Não. Mas se todos soubessem como ele nos carrega em momentos difíceis, tenho certeza que muitos mais também o usariam.

domingo, 13 de maio de 2018

Batismo

Um bebezinho foi trazido pelos pais, juntamente com alguns padrinhos. O pastor fez o sinal da cruz na fronte e no peito, questionou aos pais e padrinhos sua fé apostólica e, em seguida, derramou sobre a cabeça dela um pouco de água, dizendo: "Eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". Quer coisa mais simples que isso? O batismo é um verdadeiro Pentecostes, porém sem som de vento impetuoso, sem línguas de fogo, sem louvores em línguas estranhas, sem pregação, consistindo apenas de Evangelho compreendido na água. Deus se precaveu de cobrir cada milagre que realiza com um véu grosso, de maneira que nossa fé se exercite. A criança deixou a pia batismal cristã, filha de Deus, verdadeira crente, justificada por SUA FÉ em Cristo, salva em sentido absoluto e desde então está morrendo literalmente para o pecado.
O batismo deve ser apreendido pela fé ou então ele próprio gera a fé que irá apreendê-lo, pois é Evangelho e é capaz disso. Somente a fé possui a salvação!

A pregação não é o centro do culto

Ao entrar em uma igreja luterana, é evidente notar que em direção ao leste, o centro do serviço divino não é em torno do púlpito, este, aliás, fica ao para o lado, o ambão onde se fazem as leituras bíblicas igualmente, estão próximos ao canto, todo o centro do culto e em direção ao qual todos se prostram é o altar, a mesa do Senhor onde somos chamados a tomar do sacramento de seu corpo e sangue para perdão dos pecados.
De fato, a pregação da Palavra nos prepara para recebermos este sacramento. Cultuamos o Cristo da Palavra, e não apenas as palavras de Cristo.
Sobre o tema, deixo uma bela reflexão que li esta semana do Bispo Josep Rossello. Como representante da Free Church of England, conhecida no Brasil como Anglicana, temos uma aproximação tanto litúrgica quanto em certos aspectos confessionais, já que tantos os anglicanos quanto os luteranos se colocam como um ponto de equilibrio entre o catolicismo romano e o protestantismo da reforma.
Segue-se o texto sem alterações:

Um dos pontos que acredito ser mais importantes na liturgia cristã é o culto da Santa Ceia, que em vez de estar centrado na pregação, está centrado na Trindade.

O culto não termina nem finaliza quando o pastor acaba seu sermão. em vez disso, o culto flui em uma transição do Púlpito ao Mesa, da Palavra escrita a Palavra encarnada. Isto se faz através da confissão de fé do povo de Deus e suas orações e intercessões diante do Trono da Graça. A partir desse instante, nos adentramos no lugar santíssimo para nos sentar ao redor da Mesa do Senhor e celebrar a vitória do Cordeiro, a Ceia do Senhor. Revivendo, assim, a última ceia que agora é a eterna ceia até que o Cordeiro voltei. Enquanto esperamos tal vinda de Cristo. O estágio final desta jornada do culto cristão nos leva a ser mensageiros nas boas novas do evangelho de Jesus, assim somos enviados como povo de Deus ao mundo para fazer a vontade de Deus, incluindo pregar o evangelho e fazer discípulos.

Um dos aspectos que a Igreja tem perdido com os cultos centrados na pregação, é a visão da Cidade de Deus. A pregação é um dos aspectos centrais do drama litúrgico, porém a pregação nunca deve estar fechada somente no culto ou nas quatro paredes da "igreja local." Ela deve ser vivida e anunciada nas praças, nas conversas do café, nas reuniões da família, em todo lugar e espaço. Não precisa ser feito usando sermões, porém a pregação do evangelho puro e simples deve ser sempre ensinado em todo lugar e tempo. e não somente em longos e cansativos sermões dignos da mais pura academia, ou sermões alegres e simpáticos que atraem mais atenção ao pregador que ao próprio Senhor.
A cultura eclesiástica de que todo o culto se desenvolve ao redor da pregação, tem criado pregadores, mas não tem preparados presbíteros, nem pastores, nem ministros da palavra e sacramento. Nos encontramos diante da simple e pura realidade de que muitos dos Reformadores eram advogados e professores e, sem perceber, levaram essa cultura na igreja onde a pregação no culto tinha primazia sobre a oração, sacramento e cânticos. Por este motivo, temos que reviver o passado para criar o futuro.
A liturgia cristã teve sempre a Palavra e a Eucaristia, como parte do culto ao Senhor. O ofício divino da Santa comunhão nos leva de volta a cultos onde Deus é o centro da adoração através da Palavra e o Sacramento. O povo de Deus é instruído e Deus é celebrado. O culto não tem mais os ímpios, como centro do encontro celestial, mas o povo de Deus se congrega para o encontro com o Seu Rei para adorar na beleza da santidade de Deus. A partir deste drama revivido, o povo saí para anunciar as boas novas, discipular as nações e obedecer todo o que Jesus ensinou. Em todo, Cristo é glorificado e Deus, a Santíssima Trindade, é adorada. Somente um servo de Cristo e seu povo, e não um pregador estrela ou pop, tem a dignidade para liderar tal culto e ofício divino.

Que tal culto de adoração ao Senhor se multiplique ao redor do mundo para a glória de Deus e a edificação do seu povo.

Glória ao Pai, e ao Filho, e ao Espírito Santo;
Como era no princípio, é agora, e será sempre, por todos os séculos. Amém.


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