domingo, 4 de março de 2018

A Presença Real de Cristo no AT



A Presença Real de Cristo no AT

Lutero uma vez disse “Toda a Escritura é Cristo”, enfatizando um fator que é crucial em todo cristianismo: A revelação de Deus é Cristocêntrica! Mas como podemos falar de Cristo no Antigo Testamento? Muitos escritores modernos têm se baseado numa obra do século XIX de Wilhelm Hengstenberg, chamada “Cristologia do Antigo Testamento”. Eu mesmo cheguei a usar uma obra de mesmo nome e conteúdo parecido enquanto estudava no seminário. Toda a narrativa recai sobre as passagens messiânicas, tipologia (representações, ou sombras das coisas que haveria de vir) ou seja, falamos de profecia, não de Presença Real do Cristo pré-encarnado. Entretanto, Lutero afirmou que toda a Escritura é voltada para Cristo, não apenas estas passagens. 

Como é difícil achar bons livros sobre o tema! Alguns partiram para o criticismo histórico, que condena uma visão do Antigo Testamento voltada para Cristo, e outros autores caem por outro lado na desgastada interpretação evangelical, que adverte contra a continuidade da teologia do Antigo Testamento e do Novo (Como se Deus fosse mudar, isto tem nome, é a heresia marcionista). Em geral, muitos autores têm advertido a não buscarmos Cristo, e acima de tudo, não “cristianizarmos” a primeira aliança.

Alguns autores como Joseph Webb, o fazem ainda pior, removem do Antigo Testamento qualquer anúncio de Cristo e mesmo de Deus, alegando que cristãos devem ler a “Bíblia Hebraica”, como ele a chama, por ser um grande tratado sobre a condição humana, mitos sobre “deus”, sobre o lidar com o bem e o mal e valores meramente morais. Seria então um Testamento totalmente voltado para o homem. Não podemos de forma alguma nos esquecer que a revelação mais tardia, e especificamente a revelação de Cristo, pode sim nos guiar a entender melhor o Antigo Testamento

Aqui podemos falar em “presença real”, na forma como nós luteranos entendemos. Não estamos falando apenas da onipresença do Filho de Deus por conta de sua divindade, mas nos referimos pelo termo “presença real” pela sua presença local e tangível. Esta presença real de Cristo no Antigo Testamento é de suma importância para que se possa entender a continuidade da narrativa entre as duas porções da Bíblia como uma mesma mensagem. 

Para começarmos a entender, levaremos em consideração as palavras descritas em S. Jo 1:18 “Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse o revelou.” Este escrito no Evangelho de João parece fazer uma referência direta para com as palavras de Jesus “Ninguém viu o Pai, a não ser aquele que vem de Deus; somente ele viu ao Pai.” João 6:46 Logo, o Deus que se revela no Antigo Testamento em sua presença real é o Filho (Ele é a imagem do Deus invisível, Col 1:15)

A consequência de entendermos o Novo Testamento como um guia com autoridade para explicar o Antigo Testamento é que passamos a entender que toda a Escritura é a revelação do Filho! 

Esta centralidade de Cristo nas Escrituras não é de forma alguma nova, nem algo que Lutero tenha inventado. Ela vem da igreja primitiva, por exemplo Justino Mártir, que escreveu por volta da metade do segundo século, fez um uso bem amplo da revelação de Cristo no Antigo Testamento nas teofanias. Cristo é o Deus revelado com quem Abraão, Isaque, Jacó tiveram contato. O Filho é Deus, nele está a plenitude da Divindade. Cristo é o Deus Revelado! O mesmo que foi gerado de uma virgem, também conversou com Moisés, visível através do fogo numa sarça. Ele se revela como Deus, como a “Glória do Senhor”, o Filho, a Sabedoria, o Anjo do Senhor, o Senhor, o Verbo. Quando Justino Mártir afirma ser este o próprio Jesus, ele não se baseia em profecias, ou tipos (sombras das coisas que viriam), ou alegorias, mas no sólido entendimento que Cristo estava presente na vida do povo de Deus em todos os eventos do Antigo Testamento. Todas as vezes que Deus falava, Justino e todos os que chamamos na história da Igreja de pais ante-nicenos (os primeiros cristãos) identificaram isto como sendo participação de Cristo.

Podemos voltar mais ainda na história do cristianismo e chegarmos aos autores da Bíblia. Se lermos Judas 5, e em sequência lermos 1 Coríntios 10, veremos que São Paulo tem por claro que Cristo guiava Israel para fora do Egito pelo Deserto, e punindo a desobediência. O que dizer então do chamado de Isaías, com aquela visão majestosa de Deus entronizado entre os anjos do céu e com seus pés firmados no lugar santíssimo do templo, e o fez temer por sua vida diante daquela visão de Deus Exaltado; Sobre esta visão, São João não deixa dúvidas:

Isaías disse isso porque viu a glória de Jesus e falou sobre ele. João 12:41 

Jesus dá testemunho de si mesmo de que ele interagiu com Abraão (Jo 8:56-59).

Esta leitura centrada em Cristo e que admite sua real presença entre o povo de Deus desde o Antigo Testamento é doutrina que vem desde o testemunho do próprio Cristo, o testemunho dos santos apóstolos, dos pais ante-nicenos, reiterada por Lutero e que devemos sempre ter diante de nós.
Por séculos muitos tentaram negar a simples verdade expressa em Jo 1:18 “Ninguém viu ao Pai”. O que podemos saber sobre o Pai afinal, senão aquilo que o Filho revelou? Antigo Testamento é voltado para Cristo, tanto quanto o Novo Testamento. Sim, sem dúvidas, o mesmo Jesus que morreu por nós na cruz é, pelo testemunho de São Paulo em 1 Coríntios 10 o mesmo Deus que tirou o povo do Egito. Isto equivale dizer que é Cristo Jesus quem afirma “"Eu sou o Senhor, o teu Deus, que te tirou do Egito, da terra da escravidão. Êxodo 20:2

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